DE BICICLETA PELOS ANDES PERUANOS

de bicicleta pelos andes peruanos, cicloturismo no Peru

DE BICICLETA PELOS ANDES PERUANOS

Artigo publicado na Revista Bicicleta | número 14 | fevereiro/2012.


No início de 2011 partimos para mais uma aventura de bicicleta, desta vez fomos conhecer o Peru. Em quase três meses de viagem percorremos cerca de 3000 km de bicicleta pelos Andes Peruanos, descobrindo impressionantes riquezas culturais e naturais.

Encontramos um país cheio de contrastes. O cinza das montanhas com as roupas belas e coloridas, o frio da altitude com o calor em um lindo dia de sol, ruinas de grandes impérios e vilarejos com pouco saneamento e racionamento de água.

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Os peruanos da serra literalmente vivem sobre uma mina de metais preciosos, toda essa riqueza é explorada pelo governo e empresas estrangeiras, de forma que para grande parte do povo resta viver da difícil agricultura e pecuária sobre um terreno íngreme e árido, em um clima frio. Mesmo assim sentimos neste povo uma paz e alegria que nos contagiou.

Partindo de São Paulo, seguimos em um voo direto até Lima. No próprio aeroporto montamos as bicicletas e pedalamos até o centro.

Logo percebemos as dificuldades de pedalar em meio ao trânsito caótico e barulhento, dominado por coletivos e mototaxis buzinando e parando o tempo todo para pegar passageiros. De qualquer forma sentimos que ali ainda há um pouco de respeito pela vida humana; sinalizando nossos movimentos, conseguimos chegar sem grandes incidentes ao local onde nos hospedamos. No decorrer da viagem esse “caos organizado” se repetiu em cidades de maior porte, e assim fomos nos acostumando a fazer parte do trânsito peruano.

Ainda em Lima visitamos alguns museus, um em especial nos agradou, o Museu do Banco Central de Reserva del Peru. A visita é gratuita e acompanhada por um guia. Com a ajuda desse jovem rapaz aprendemos sobre as culturas pré-incas e sobre a arte contemporânea do país.

Para nossa surpresa todos os guias que nos acompanharam em museus e sítios arqueológicos visitados durante a viagem eram muito bem treinados e sabiam muito sobre a história e cultura de seu país.

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Ao lado do sítio arqueológico da Huaca de la Luna, legado da civilização Moche (região de Trujillo).

Nossa intenção era conhecer os Andes Peruanos e, apesar de termos nos preparado para a viagem nas montanhas da Serra da Mantiqueira, decidimos nos aclimatar pedalando no sentido norte da Rodovia Panamericana.

Chegando a Huanchaco, cerca de 600 km ao norte de Lima, iniciamos a subida para a serra. Depois de quatro dias de subidas atingimos os 4170msnm e começamos a descer para Santiago de Chuco.

Com tantas viagens no currículum, atravessando as montanhas mais altas do mundo, o Olinto já estava mais que acostumado a vencer desafios como este. Mas comigo era diferente, esta foi a minha primeira experiência de sair do nível do mar e atingir grandes altitudes. Desci os 17 km que separam a cidade do passo em um misto de satisfação e êxtase. Eu tinha vencido a montanha, a altitude, o frio e a chuva que ainda molhava serra nessa época do ano.

Conforme nos aproximávamos da cidade, as pessoas que trabalhavam nas obras da estrada nos cumprimentavam e fiquei muito emocionada com a calorosa recepção. Mal eu sabia que atravessar passos a mais de 4000 m de altitude seria nossa rotina durante a viagem.

O fato de atingir a altitude pedalando traz uma vantagem no que diz respeito ao “mal de altitude”: como subimos um pouco por dia, é mais fácil o corpo se acostumar com a quantidade menor de oxigênio.

No meu caso, até passar o primeiro passo, só tive um pouco de dor de cabeça. Porém, após o descanso em Santiago de Chuco, comecei a sentir outros efeitos como dores no corpo, enjoo e falta de apetite, que só passaram com os dias de repouso.

O mapa que conseguimos em Lima era antigo, tinha poucas indicações sobre altitudes e tipo de pavimento, além de não indicar quilometragens entre várias cidades que fariam parte do nosso trajeto.

Isso nos proporcionou várias “surpresas” pelo caminho, muitas vezes não tínhamos a mínima ideia de quanto faltava para chegar a determinada localidade e muito menos se haveriam passos pelo caminho, o que depois descobrimos ser uma constante na serra peruana. Com o relevo acidentado, as estradas sempre desciam até algum rio, passavam uma pequena ponte para depois subir novamente.

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A estrada que percorremos durante quase toda a viagem estava assinalada no mapa como a Ruta 3, uma longitudinal que atravessa o país pela serra e é considerada a estrada principal, já que na maioria dos trechos é a única. Devido à dificuldade do relevo e às más condições da estrada, a maioria dos peruanos prefere descer até o litoral e seguir pela Panamericana para atravessar o país. O caminho pela serra não é nada óbvio. Somente na região entre Huanuco e Huancayo e após Ayacucho é que encontramos asfalto e estradas em melhores condições.

A partir de Santiago de Chuco seguimos rumo sudeste, passando pela Cordilheira Branca, pelas margens dos rios Maranhão e Mantaro, pelo Vale Sagrado do rio Urubamba, por Cusco, até chegar ao Lago Titicaca, onde terminamos a viagem (veja o mapa do percurso).

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Em Ollantaitambo, ruínas da cidade Inca.

Dificuldade para encontrar locais para camping selvagem foi uma constante, também devido ao relevo acidentado. Onde há uma área plana, “pampita”, como os peruanos dizem, sempre há uma casa e algo plantado.

Praticamente todos os dias em que acampamos pedimos autorização para montar a barraca na propriedade de alguém, ou no campinho de algum povoado. Dessa forma sentimos de perto a gentileza e solidariedade dos peruanos com os viajantes.

Em vários locais fomos presenteados com comida, o pouco que tem dividem com quem está apenas de passagem. Lembro em especial de um dia em que acampamos ao lado do campo de futebol da cidade de São Pedro, na província de Cusco. Depois de uma noite fria (a temperatura chegou a 3 graus), enquanto esperávamos a barraca descongelar e secar, surgiu uma senhora no horizonte, se aproximou de nós e nos presenteou com um saco cheio de milho. Ela era muito simples, com muitas marcas da vida sofrida em seu rosto e com a roupa surrada. Sem dizer nada apenas nos entregou o milho quentinho e foi embora. Fiquei muito emocionada e agradecida.

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Assim, na velocidade da bicicleta e com nossa própria força, conhecemos muitos recantos desse incrível país, montanhas, glaciares, cachoeiras, cânions, desertos, lagos, florestas, ruínas de grandes civilizações antigas, danças, festas, cores, aromas, sabores e sensações, imagens que se refletem em nós mesmos e nos transforma. De volta para casa já não somos mais os mesmos, fizemos a viagem e ela nos refez, nos mostrou uma vez mais um mundo belo e solidário, que sempre estará a espera de nossa visita.


Saiba mais sobre esta viagem e sobre o Documentário IMAGENS: de BICICLETA pelos ANDES PERUANOS.


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